21/04/2019 às 03h26min - Atualizada em 21/04/2019 às 03h26min

A vida de dois brasileiros que ousaram recomeçar em terras estrangeiras

No Domingo de Páscoa, a emocionante trajetória de dois jornalistas que não tiveram medo ou receio de reconstruirem suas vidas em outro país

ANDRE LUIS CIA
Divulgação
Cruzar fronteiras rumo ao desconhecido. Aventurar-se sem saber ao certo o que o destino lhe reserva nessa nova caminhada. Viver sem pensar muito no amanhã, mas com o coração pulsando fortemente no dia de hoje. É mais ou menos assim, envoltos nessa complexidade de sentimentos e de incertezas que muitas pessoas deixam sua terra natal em busca de um recomeço. E neste domingo de Páscoa, data tão simbólica e de esperanças renovadas, no dia do renascimento de Jesus, que as histórias de dois jornalistas mineiros, Eduardo e Claudinéia, se cruzam pelo mesmo motivo: a busca de um recomeço, de uma vida nova em uma pátria estrangeira. Ambos fazem companhia aos milhões de brasileiros que vivem no exterior. Em 2016, o Ministério das Relações Exteriores calculava que o número chegava há 3 milhões de pessoas, mas há diferentes estatísticas e análises sobre o tema.  
Aos 50 anos, coincidentemente, completados neste domingo (21), Antonio Eduardo Gregori, o “Edu”, está há um ano “fora de casa”. Optou por Portugal porque era a terra do marido. Confessa que o país lusitano o acolheu de “braços abertos” e que o fez deslumbrar um horizonte diferente de tudo que já havia vivido até então. “Ao contrário do que muitos pensam, a vida de um imigrante não são somente flores. Por outro lado, são tantas coisas positivas que até mesmo as dificuldades se tornam pequenas”, compara.
Edu aponta que os portugueses o receberam muito bem e que, hoje, se sente totalmente feliz pela decisão de ter deixado o Brasil. Trabalha atualmente como analista de dados em uma grande empresa americana, e com o salário que recebe consegue ter uma vida estável, viajar e realizar todos seus desejos sem se privar de absolutamente nada. Além disso, vive num país totalmente seguro, lindo, culturalmente rico, com clima tropical semelhante ao brasileiro e sem taxa de violência. Outra coisa que o agrada muito em Portugal é a liberdade sexual que sente vivendo no país. “Posso andar tranquilamente pelas ruas de Lisboa, por exemplo, ao lado do meu marido, que ninguém irá me julgar ou apontar o dedo pelo fato de eu ser homossexual. E isso é maravilhoso porque, infelizmente, no Brasil não podemos dizer o mesmo”. (O Brasil lidera as estatísticas mundiais de violência e assassinato contra a população LGBT).
A decisão de deixar o país foi tomada principalmente pela instabilidade financeira e pela crise que o país atravessa há anos. Edu se formou em Comunicação Social- Jornalismo, em 1998, na mesma turma que Claudinéia, e antes mesmo do término da faculdade já trabalhava no jornal “Correio Popular”, em Campinas, um dos periódicos mais respeitados e antigos do Estado de São Paulo. Ao longo dos últimos 20 anos teve muitas conquistas no jornal campineiro. Em 2016, acabou saindo do trabalho e ficou um ano desempregado até recomeçar num novo desafio profissional numa agência de turismo, mas com o tempo foi percebendo que não era bem aquilo que buscava e foi essa insatisfação profissional que o levou a querer alçar voos diferentes. “Quando optei por Portugal tinha em mente que a adaptação seria mais fácil e vi que tinha razão na minha escolha. Aqui posso continuar desenvolvendo minha paixão pelo jornalismo, que sempre foi e será minha grande paixão”. Edu continua escrevendo como jornalista em um blog.   























Edu confessa estar totalmente feliz e realizado por ter recomeçado uma nova vida

Neste domingo (21), ao completar meio século de vida, Edu publicou um depoimento emocionante no Facebook agradecendo a cada uma das etapas que teve de enfrentar e o quanto cada uma delas foi importante para tê-lo transformado na pessoa que se tornou. “Fui expulso de casa na adolescência. Mudei para o Rio. Depois para Campinas. Vendi pão na rua. Entrei na faculdade e me tornei jornalista. Cantei em casamentos, corais e em bandas de rock. Fiquei quase 20 anos no mesmo trabalho, viajei (e viajo) o mundo. Lutei e luto pelos direitos dos LGBTs. Fui trabalhar com viagens. Casei no papel. Fiquei um ano desempregado. Vendi meu carro e juntei dinheiro para começar uma nova vida. Vivo há um ano em Portugal e em breve serei português. Esse é o resumo de uma trajetória de 50 anos que cumpro hoje com muito orgulho. Obrigado a quem fez e a quem faz parte desta jornada que segue”.
 
PIMENTA NA FESTA, NA ALMA E NO CORAÇÃO
Paixão também é a palavra que define bem a trajetória da jornalista Claudinéia Cardinalli, pois em tudo que ela faz há uma dose extra de amor e entrega, seja como jornalista, animadora infantil (palhaça), voluntária, e nos últimos dois anos no seu melhor e maior papel: o de mãe. Apelidada ainda na infância pelo avô de “Pimentinha” devido à personalidade peralta e agitada e também ao gênio semelhante ao de uma pimenta malagueta, ela nem imaginava que seria nos EUA que reconstruiria sua vida após duas perdas grandes e irreparáveis no Brasil: a morte do pai e da irmã Claudia.   
Mineira de Poços de Caldas, Claudinéia, “Neia” para os íntimos, se orgulha por ser a única brasileira a integrar o grupo de palhaços de Nova Iorque. Além disso, é voluntária em inúmeros projetos sociais, como de pessoas com câncer, de crianças carentes ou com necessidades especiais, dentre outros. E o mesmo amor que faz suas festas particulares é depositado nas causas sociais. Essa alegria fica estampada no seu rosto quando sabe que por meio do seu trabalho, o de palhaça, conseguiu confortar um pouco o coração de tantas pessoas necessitadas que, muitas vezes, precisam apenas de um sorriso, comi por exemplo, visita hospitais espalhando alegria e sorriso. É difícil vê-la triste ou desanimada. É daquelas pessoas que esbanja vitalidade e carisma. Difícil não se contagiar por sua alegria de viver.   
Néia chegou à América no final de 1999, um ano após ter concluído o curso de jornalismo na Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas). Antes de sair do Brasil sua mãe Elza pediu para que levasse na bagagem as roupas de palhaça que usava em trabalhos no país. “Eu tinha experiência de sete anos nessa área de animação e fiquei com a esperança de fazer isso também na minha nova vida americana, e não é que deu certo?”, relembra.




























Claudinéia vestida como a palhaça Pimentinha, seu apelido de infância              

TRAJETÓRIA DE SUCESSO
Para sua surpresa não haviam animadores nos Estados Unidos. Começou fazendo festas em Nova Iorque, New Jersey e Connecticutic três semanas após ter desembarcado no país. No passado, os pais Elza e Victor haviam sido os primeiros a emigrarem no início da década de 80 e foram eles que a incentivaram a emigrar também. “Quando acabei a faculdade vim consciente que teria que estar disposta a trabalhar em outras áreas se quisesse crescer profissionalmente”. Aos poucos, foi aprendendo o idioma e superando todos os desafios.
 No final de 2013, Néia casou-se com americano Robert Douches que, eventualmente, a ajuda nas festas trabalhando como mágico, mas a união com Douches foi responsável pela sua maior alegria e razão de viver atualmente: o nascimento do pequeno Robert, de dois anos. “Sou muito grata a Deus por esse presente. Sempre quis ser mãe, pois minha vida toda animei a festa de outras crianças. Sonhava com o dia que também teria o meu filho junto comigo nas minhas festas”. E o pequeno a acompanha sempre que pode em alguns eventos, e parece ter herdado o jeito despojado e irreverente da mãe porque o sorriso fácil já é uma de suas marcas registradas.  
 “Ser palhaça me proporciona estar em várias culturas e também a chance de conhecer um pouco a cultura de cada um destes países durante uma apresentação. Eu me envolvo com os costumes e tradições deles durante as festas”.  
Engana-se quem imagina que Néia abandonou sua outra paixão: o jornalismo. Assim como o colega de turma Edu, mesmo em terra estrangeira, ela faz questão de exercer o dom pela comunicação. Trabalhou em alguns jornais voltados à comunidade brasileira e também como assessora de imprensa. Fez documentários em inglês e português, e atualmente realiza matérias especiais e planeja ter seu próprio canal na internet. Além disso, já separa material para a produção de um documentário que contará sua vida como animadora infantil no exterior. “Os nossos sonhos estão dentro de cada um de nós, independente do lugar onde estamos. Basta dar asas a eles”.  
 

Néia ao lado do filho Robert, sua grande e maior paixão

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