06/11/2017 às 17h25min - Atualizada em 06/11/2017 às 17h25min

Deficiente auditivo relata constrangimento durante prova do Enem em S. Bárbara

Cristiane Caldeira
Redação
Foto: Divulgação
O estudante Danilo Maralha Ribeiro, 17, que prestou ontem (05) a primeira prova do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) na Faculdade Anhanguera, em Santa Bárbara d'Oeste, passou por constrangimento ao ser retirado da sala onde respondia as questões ao ter o aparelho que usa em razão de sua deficiência auditiva confundido com ponto eletrônico. Ele foi revistado, obrigado a retirar o aparelho para fazer a prova e o recebeu de volta danificado. A família registrou boletim de ocorrência e espera reaparação dos danos materiais.
A auxiliar odontológica Emirlei Ribeiro Maralha, mãe de Danilo, contou que o filho comunicou a deficiência auditiva em formulário próprio, ao fazer a inscrição para o exame, e não esperava passar pela situação. "Até detector de metais usaram", afirmou. Depois de ser submetido a revista, ele recebeu o aparelho dentro de um saco plástico e foi obrigado a mantê-lo debaixo da carteira até terminar a prova. E só percebeu que ele não estava funcionando quando o colocou de volta para voltar para casa.
 
Emirlei conta que o filho nasceu com deficiência auditiva total em um dos ouvidos e parcial em outro, com o qual ele consegue ouvir com a ajuda do aparelho. Por conseguir se comunicar verbalmente e não precisar de Libras (linguagem de sinais), ele dispensou auxiliar para a prova ao fazer a inscrição. "Na escola em que ele estuda (Dirceu Dias Carneiro) ele tem auxiliar, mas nunca passou pela nossa cabeça que uma coisa dessas fosse acontecer", relata a mãe. 
Além do prejuízo com o quebra do aparelho, o rapaz se sentiu prejudicado na realização da prova, visto que perdeu tempo com o procedimento de revista e ficou emocionalmente abalado com o ocorrido. Por este motivo, ele se recusa a voltar no próximo domingo para realizar a segunda etapa do exame. 
Por estar sem o aparelho, Danilo, que faz um curso de Fabricação Mecânica no Senai (Serviço Nacional da Indústria), perdeu uma prova em que teria de fazer uma explanação oral hoje no período da manhã. Emirlei diz que o filho se recusa a participar das aulas porque não consegue ouvir sem o aparelho.
A família vai retirar hoje cópia do boletim de ocorrência e procurar orientação de advogado para saber as providências a serem tomadas. Ontem, quando o rapaz relatou o ocorrido à família, o pai voltou à Faculdade Anhanguera para falar com os organizadores do Enem e foi informado apenas que "foi adotado o procedimento padrão". 
Danilo passará amanhã pela fonoaudióloga para que ela avalie os danos ao aparelho, mas a família adianta que não dispõe de recursos para comprar ou alugar outro equipamente no momento. Segundo Emirlei, eles pagaram R$ 8 mil no aparelho há três anos. Hoje, um aparelho do mesmo modelo estaria custando mais de R$ 15 mil.
 
TRAUMA
 
Danilo cursa o terceiro ano do Ensino Médio e embora tenha nascido com a deficiência, que não foi detectada logo que ele nasceu, foi alfabetizado e lida naturalmente com ela. 
Emirlei conta que o filho pretende cursar faculdade de Educação Física ou Engenharia, e sempre recebeu todo incentivo da família. No entanto, o episódio de ontem o deixou traumatizado e recluso. Além de não querer fazer a segunda prova do Enem domingo que vem, ele não quer ir ao curso do Senai. "Não consigo entender o que os professores e os amigos falam, vou fazer o quê lá?", foi o que ele disse à mãe ao justificar o porquê de ter se recusado a fazer a prova do Senai hoje.
 
REDAÇÃO
 
O tema da redação do Enem 2017 foi "Desafios para a formação educacional de surdos no Brasil". O abordagem pedida era que os candidatos apresentassem "proposta de intervenção que respeitasse os direitos humanos". 
Quatro textos motivadores foram apresentados aos candidatos, com dados que mostravam números de alunos surdos na educação básica, legislação e preconceito. A coincidência deixou os familiares e amigos de Danilo ainda mais revoltados.
"Quais seriam esses desafios? Desafio dos professores ao ensinar esses alunos? Desafio dos alunos para se incluírem numa sociedade corrompida, preconceituosa? Se na folha de inscrição constava que o candidato era deficiente auditivo, por que exigir que retirasse o aparelho? E ao examinar o aparelho, por que danificá-lo? O maior desafio é a formação educacional para todos não só para os surdos!", escreveu o dentista Marcelo Queiroz, que trabalha com Emirlei, em uma rede social.
O Portal Atualidade pediu um posicionamento ao MEC (Ministério da Educação) sobre o caso. O órgão repassou a responsabilidade ao Inep (Insituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), responsável pelo Enem, que por sua vez informou que se posicionaria após apurar os fatos.

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